segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

NATAL


Parece que foi ontem que o nosso blog deu os primeiros passos e já lá vai mais um ano...
De facto o tempo passa rápido, talvez excessivamente rápido para que possamos ter visto satisfazer os mais legítimos anseios de muitos dos ex-combatentes nas ex-colónias, que no seu dia a dia, continuam a sofrer no corpo e na alma, as consequências de uma guerra que todos nós sabemos ter deixado marcas, certamente de forma mais marcada nuns do que noutros...
Vamos esperar que 2010 traga consigo a melhoria da situação económica do país e que dessa forma, os nossos "governantes encontrem espaço e vontade" para resolverem as necessidades mais prementes daqueles nossos "camaradas de armas" que mais dificuldades passam.
Vamos acreditar que o NATAL que agora chega, lhes traga ânimo e a esperança de melhores dias.
Para todos nós e os nossos familiares e amigos, os votos de um Santo Natal e que 2010 permita a realização dos nossos projectos mais ambicionados.
Um outro desejo.... que haja mais amigos a colaborarem para que o nosso blog se mantenha vivo. Basta que nos enviem fotografias que certamente têm convosco. Nós prometemos devolvê-las, depois de as inserir no blog... claro.
Um abraço.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Chiede - O quartel






Fomos para o Chiede numa altura em que se começou a falar que a guerrilha poderia "eclodir" de um momento para o outro no Sul de Angola. Não havia ainda instalações definitivas. Meia dúzia de pre-fabricados e umas tendas de lona, quentíssimas durante o dia e geladas durante a noite. Casas de banho não havia. Cavavamos umas latrinas e era assim que faziamos as nossas necessidades.
Quem se lembra deste velhinho (já me não lembro do nome...) que nós alimentavamos e que passava os seus dias em redor do quartel?
A "messe" de oficiais e de Sargentos era uma palhota com duas ou três mesas onde tomavamos as refeiçõs e obviamente fazíamos as nossas partidinhas de bridge e de xadrez.
O primeiro cabo Correia até aprendeu a cavalgar, à falta de cavalo num burro que existia por lá...
E claro, o campo de futebol não podia faltar.....

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Regresso a Luanda



Foi assim que regressamos a Luanda, para por fim voltarmos à "Terra Mãe". Cada grupo de combate tinha direito a uma camioneta destas e lá vinhamos mais ou menos "amontoados" quase como de gado se tratasse. Felizes dos que tinham lugar na cabine do condutor. Como a antiguidade era um posto, na cabine só coubemos eu próprio e os furrieis Silva e Almeida. O Furriel Santos, o mais "novo" dos três, teve de vir na caixa aberta da camioneta. Lembro-me que dormimos em Nova Lisboa. No meu caso específico, debaixo da viatura. Mas dormir no chão já nós estavamos mais do que habituados...
Lembro-me que o furriel Santos chegou a Luanda com os lábios todos "gretados" fruto da aragem fria que apanhou durante os mais de mil Km que tivemos de fazer durante a viagem.
Na segunda fotografia reconhecem-se o Telo e o Ávila dois açoreanos leais e amigos como a generalidade dos açoreanos que integravam o 1º Grupo o eram e, óptimos militares...

Três amigos


Muitas amizades se fizeram na guerra algumas das quais ainda perduram. É o caso destes três oficiais da C. Caç. 3482 em Namacunde, que ainda hoje continuam amigos. Uma das poucas coisas boas que a guerra nos propiciou....

Nativos com trajes tradicionais



Nos dias festivos, os nativos no Sul de Angola, pintavam o corpo com uma qualquer tinta vermelha e vestiam igualmente trajes de cor tambem avermelhada. Nestas fotografias podemos apreciar esse vestuário e o arco e flechas que normalmente traziam consigo e que utilizavam na caça.
Neste dia, um dos nativos ofereceu-me um arco e várias flechas. O arco ainda o guardo e mantem-se operacional, as flechas é que foram enferrujando e acabaram por desaparecer...

Tempestades Tropicais




Eram famosas as tempestades tropicais que por vezes se abatiam sobre nós inundando tudo. Mas quantos banhos maravilhosos tomamos debaixo daquelas chuvadas intensas....
Quem por vezes se aventurava pelas picadas naquela zona praticamente inexistentes, o mais certo é que ficasse atascado em qualquer charco que se formavam por todos os lados.
Numa destas fotografias pode ver-se como ficava a zona do quartel onde parqueavamos as viaturas quando assim chuvia. Na outra podemos ver uma das imensas vezes em que fomos chamados para "desatascar" um qualquer imprudente que se resolveu meter-se ao caminho pelas matas do Chiede...

sábado, 5 de dezembro de 2009

Rita


Conheci a Rita em Ambrizete. Esta fotografia foi tirada na Mussera com o Rita a apresentar-me a autorização de "circulação". Por um lado a dar-me a conhecer a autorização que lhe permitia deslocar-se nas nossas viaturas e nas colunas que organizavamos, mas sempre de pé atrás desconfiada, não fossem as nossas intenções menos sérias. Nesta fotografia nota-se claramente que estava pronta para dar uma corridinha se isso fosse necessário. Estava, no entanto, sempre disponível para uma qualquer conversa mais ou menos brejeira, como quando me disse que se devia fazer sexo com homens velhos da Senzala "porque eles tambem precisavam....".
Foi uma das negras mais lindas que conheci em Angola, mais linda mas também mais "esquiva"....
Lembro-me que um dia, na Musserra", o furriel Soares conseguiu que ela entrasse no meu quarto fechando de seguida a porta à chave. Lá ficamos os dois durante cerca de meia hora. Ela receosa e pedindo que a deixasse sair e eu portando-me como um cavalheiro. Saíu sem que lhe tocasse... soube depois que havia subido uns pontos na sua consideração...

G3 e Walter


Foram estas as armas que durante os cerca de 28 messes de comissão em Angola me acompanharam: A G3, que por acaso era extremamente certeira, a walter e o cinturão com os quatro carregadores (quando iamos em operações cada um de nós levava cerca de cem balas)as granadas ofensivas e o dilagarma.
É impossível, a alguém que não fez a guerra colonial, imaginar a segurança que estas armas nos davam "na mata". Faziam parte da nossa vida diária e acompnhavam-nos sempre. Sem elas eram como se andassemos despidos. Com elas sentiamo-nos como uma "espécie" de "super heróis" capazes de afrontar todos os perigos.
Penso que a G3 ainda foi recebida na metrópole e depois acompanhou-nos até ao dia do regresso.
Um episódio que revela a fiabilidade das G3 aconteceu ainda em Lamego. Depois de tirar a curso de Operações Especiais, vulgo "Ranger", fiquei como instructor de tiro do curso que nos seguiu em Lamego e que terá sido o do 3º curso de 1971. Acontece que estava na "carreira de tiro" a dar mais uma lição de tiro, quando correndo chegou perto de nós um dos cabos que prestava serviço no quartel, na época sedeado em Penude. Ofegante gritou para mim "meu Aspirante" numa das àrvores junto do quartel está "um pássaro enorme". Sim, então e depois? retorqui eu. "Meu Aspirante" vá lá matá-lo respondeu o Cabo. Depois de olhar para ele, avaliando se não estaria a ser gozado, pedi uma G3 a um dos formandos que estava a acertar razoavelmente no alvo e lá fui eu em direcção ao quartel. De facto numa das árvores, bastante altas que na altura circundavam as casernas, lá estava um pombo bravo de dimensões muito apreciáveis. Com quase toda a Companhia a observar, incluindo o Capitão "Comando" Reis Moura, digo eu com imensa curiosidade e com a esperança de ver o "Oficial de Tiro" a passar por uma situação menos agradável, lá apontei a G3, à semelhança do que fazia na Beira Alta quando caçava com a pressão de ar e disparei os dois tiros rápidos da ordem. O pombo bravo apanhado em cheio caíu redondo na parada. Senti que nessa hora, "virei" para aqueles futuros Oficiais e Sargentos "Rangeres" uma espécie de ídolo.
O Pombo serviu de jantar para o Oficial que naquele dia etava de serviço e que no dia seguinte se "queixou" de que o pombo estava bom mas um pouco duro... pudera, a ajuízar pelo tamanho devia ter alguns anos de idade...para mim ficou para sempre a certeza de que a G3 estaria sempre ali para demonstrar a sua eficácia, como por diversas vezes o veio a demonstar em situações menos agradáveis do que a que acabo de descrever.
Já em Angola, quando estavamos no Loge, recebi uma lição que não mais esqueci durante a presença em Angola. Numa qualquer sessão de caça, descobri que a "minha eficiente G3" não dava um tiro que não encravasse de seguida. Teria sido catastrófico se isso tem acontecido numa qualquer cena de guerra. Acontece que por vezes esqueciamo-nos de as limpar.... isso terá sido a causa de inúmeras situações desagradáveis para muitos outros camaradas durante a guerra.
A partir desse dia passou a haver, todas as semanas, uma sessão de limpeza das armas, sendo que isso passou a ser feito, sempre, depois de qualquer coluna em que o pó das picadas nos deixava irreconhecíveis...

Chiede - Kimbo




Na zona do Chiede os povoados nativos eram chamados de Kimbos. Normalmente eram constituídos por várias palhotas circulares, que eram circundadas por ramos de arvores que constituiam uma espécie de paliçada que era suposto proteger dos animais selvagens, que nunca vi, mas que se dizia existirem na região.
Nos arredores dos kimbos cultivavam uma espécie de "painço" que depois de fermentado produzia uma bebida alcoólica chamada "belunga". Cheguei a provar mas sinceramente não fiquei fã.
Tambem apanhavam em determinadas árvores, lagartas de um tamanho considerável, que depois de secas ao sol constituiam, diziam, um manjar dilicioso. Um dos Alferes da Companhia não gostando que a sua "lavadeira" usasse tal insecto na sua dieta alimentar, bem tentou dissuadi-la disso, chegando mesmo a comprar periodicamente carne no talho de Pereira d'Eça, para a que a dita lavadeira delas abdicasse. Tanto quanto sei não conseguiu... mas tambem me não lembro se ele abdicou da lavadeira....
Quando recentemente me desloqueia Angola, fomos almoçar a um restaurante de luxo (pelo menos era muito caro) na baixa de Luanda perto dos Correios. Não é que um dos aperitivos servidos eram essas "lagartinhas"? E não é que os meus colegas que tiveram a coragem de provar disseram que eram muito saborosas?
Se algum dia voltar ao Chiede, Namacunde ou Santa Cruz provarei eu também... mas só lá. Em Luanda, por certo que não terão o mesmo sabor...

Namacunde - a mémé



O pelotão que fomos substituir em Namacunde "legou-nos" um cabritinho com uns poucos dias de idade. Aconselharam-nos a alimentá-lo durante mais uma semanas e depois faríamos uma daquelas famosas caldeiradas que sempre caracterizaram Angola, normalmente com bastante piripiri.
Logo alguém se lembrou de lhe chamar mémé e passou a ser uma espécie de mascote que crescia a olhos vistos e que nos acompanhava como um autêntico cão, fossemos para onde fossemos.
Numa destas fotografias podemos ver o furriel Santos e a dita "mémé".
Claro que ninguém teve coragem de fazer a tal caldeirada. Por lá ficou quando regressamos a Luanda.O que lhe aconteceu depois, nunca o saberemos.

Chiede - Patrulhamentos pela Angola Profunda






No Chiede não havia guerra. A actividade militar limitava-se à acção psico-social junto das populações nativas, à prestação de cuidados médicos às populações do interior e, de quando em vez, a um ou outro patrulhamento que normalmente duravam dois ou três dias e durante os quais chegavamos a penetrar duzentos ou trezentos Km pela "Angola Profunda".
Nesses patrulhamentos podiam acontecer as coisas mais inesperadas, desde "darmos de caras" com uma qualquer beldade nativa, normalmente sem qualquer vestuário na parte superior do corpo, com manadas de cavalos de uma qualquer raça, mas com aspecto óptimo, como a fotografia que anexo comprova.
Lembro-me que uma vez encontramos um grupo de bosquímanes que deambulavam pela mata num grupo relativamente numeroso. Ainda hoje lamento não ter feito um esforço adicional para tentar "dialogar" com eles. Lembro-me que a forma de se expressarem era através de "estalidos" num som gutural que faziam com a língua e a garganta. Gostria de facto de ter entabulado qualquer tipo de conversação com eles mas, mais ainda, lamento não os ter fotografado. As crianças e as jovens, semi-nuas, eram extremamente lindas com uma cor de pele perfeitamente clara, semelhante à da raça mongol. Os olhos aprsentavam sinais semelhantes aos de qualquer raça oriental. Teremos sido, talvez, os primeiros brancos que eles terão visto. Ainda hoje me pergunto como terão ido parar áquelas paragens? Será que conseguiram sobreviver à guerra que após a nossa saída desvastou o sul de Angola? Será que continuam a deambular pelas matas da savana africana?
Numa das fotografias que apresento reconhecem-se o Moreira, 1º Cabo especialista em armas pesadas e que virou cozinheiro, o famoso Gregório condutor que adorava uma cucas fresquinhas e o furriel Almeida.